quarta-feira, outubro 05, 2005

Utilidades #3


Vini Reilly, amigo de Portugal como há poucos, mentor e alma mater do projecto Durutti Column, que muitas alegrias sonoras trouxe ao Imberbe e a todos os que, como ele, partilham da idéia de que a música deve ser fruída e não vendida a peso, escutada e não negligenciada, amada mas não saqueada, traz-nos uma pérola do seu vasto repertório: "Amigos em Portugal" , disco originalmente editado em Dezembro de 1983 pela extinta e saudosa Fundação Atlântica do imberbe-mor Miguel Esteves Cardoso e agora -finalmente- editado no formato CD, o que sucede pela primeira vez.
Outros eram os tempos, em que os nomes "Sara" e "Tristana" significavam, para o melómano instruído, o título de uma faixa do álbum e não os nomes de apresentadoras de medíocres reality-shows (em ambos os casos as filhas gémeas de Miguel Esteves Cardoso, mas trata-se de mera e infeliz coincidência...).
Mas, perguntam vocês, como raio o M.E.C. conseguiu editar, na sua minúscula mas bem intencionada editora, um LP dos já à época prestigiados Durutti Column? É essa a história que aqui vai ser contada...
Temos pois que recuar aos idos de 1977, onde um pubescente Miguel Esteves Cardoso, recém-chegado a Manchester para iniciar os seus estudos universitários de Sociologia Política (sim, naqueles bárbaros tempos cursos como Gestão, Economia e Direito ainda não existiam, razão pela qual os políticos da altura eram todos militares...), mas mais interessado em conhecer as actividades noctívagas do velho burgo industrial, tropeça num certo "Factory Club", velho pub manhoso e cheio de ranço que um jornalista de seu nome de baptismo Anthony H. Wilson decidira reconverter em clube rock e onde actuavam bandas de nomes estranhos como Buzzcocks, Cabaret Voltaire e um quarteto que muito impressionou o jovem luso. Chamavam-se a si mesmos Joy Division e, capitaneados por um vocalista epiléptico que cantava letras da sua autoria, tocavam um rock visceral de fortes laivos punk. Numa dessas noites, conheceu um rapaz esquálido e tímido de seu nome Vini Reilly que, acompanhado de uma guitarra eléctrica Gibson e de uma caixa-de-ritmos primitiva, tocava uma música belíssima, etérea e impressionista, primordialmente instrumental.
Ao regressar à nossa pátria ditosa, M.E.C. enveredou pelo jornalismo musical. Quem se lembra das suas crónicas nos extintos pasquins "O Jornal" e "Sete" deve ainda hoje soltar risadinhas de prazer ao recordar o iconoclastismo do escriba. A quem nunca leu, o Imberbe aconselha a aquisição do livro "Escrítica Pop", onde tais crónicas se mostram colectadas em edição Assírio & Alvim.
Mas M.E.C. queria algo mais. Com a ajuda dos amigos Pedro Ayres de Magalhães e Francisco Sande e Castro (que entrou com o sempre necessário capital...), decidiu aventurar-se nos terrenos escorregadios e traiçoeiros da edição musical. Aliando-se à filial portuguesa do gigante EMI, fundou uma editora a que deu o nome "Fundação Atlântica".
Após as primeiras e bem-sucedidas edições (como o single estréia da Sétima Legião, o clássico "Glória") M.E.C. e os seus acólitos decidem editar um disco de um artista internacional. Ao bom estilo M.E.C., a operação é rápida: aproveitando a visita a Portugal de Vini Reilly (que mantivera com M.E.C. laços de estreita amizade) para uma série de shows, alugam os estúdios de gravação de Paço D'Arcos e, num fim-de-semana (pois o orçamento não dava para mais), gravam aquele que seria "Amigos em Portugal", um futuro clássico.
Claro que a Fundação Atlântica pouco mais durou, vítima do romantismo sem concessões e da inocência dos seus mentores. Fica-nos como legado, entre outros discos notáveis, "Amigos em Portugal"...

4 Comments:

Blogger Jesualdo Salta-Pocinhass said...

Quite interesting...


Por curiosidade:
o Porto agora tb tem um "velho pub manhoso e cheio de ranço", com a diferença de não haver concertos. Chama-se Tendinha e fica situado à beira dos Clérigos. Passa sempre Joy Division, New Order e afins...
Apesar de na maior parte das vezes aquilo ser um antro de larilada, é um bom sítio para uma noite de emborrachamento colectivo.

9:42 da tarde, outubro 05, 2005  
Blogger jorgeteixeiraakajorgeteixeira said...

"à beira dos Clérigos"

Can U be more specific (não é preciso ir ao Google Earth)

10:13 da tarde, outubro 05, 2005  
Blogger Jesualdo Salta-Pocinhass said...

LOL. Era mesmo para n te sentires tentado a lá ir... E dou-te duas razões mt fortes:

-Uma vez (ok, mais de uma vez) uma cabrona de uma anã feia como um porco tentou-me engatar e quando viu que n levava nada começou a salpicar-me com cerveja:(

-Mais recentemente ainda, um amigo meu foi assediado por 2 larilões, ficando de tal forma traumatizado que se recusa a descrever o approach!

10:32 da tarde, outubro 05, 2005  
Blogger jorgeteixeiraakajorgeteixeira said...

De facto não sei o que será mais traumatizante:

a anã com manias de Mannekken Piss ou os Castelos-Brancos gémeos...

10:40 da tarde, outubro 05, 2005  

Enviar um comentário

<< Home